quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

CRIANÇAS NATIVAS: Relações entre infância, educação e escolarização PARTE II

Nesta parte vamos abordar como se construiu a identificação e a avaliação pedagógica dos livros didáticos que tinham por objetivo contribuir para o conhecimento dos povos indígenas sejam na Alfabetização, Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia e o Dicionário da Língua Portuguesa.  
De acordo com estudos de pesquisas anteriores, estes livros traziam em seu corpo o conceito das sociedades indígenas como pessoas ultrapassadas, como uma lenda, maquiando a quantidades de povos existentes no território brasileiro, atribuindo aos índios um tratamento estereotipado, ao contrário de grande parte das produções de conhecimento da etnologia indígena contemporânea.
As discussões tratam da análise dos livros didáticos atuais e como estes se mostraram  influentes no  tratamento aos povos indígenas no que diz respeito a educação destas sociedades, e como pontuavam as questões relativas a diversidade cultural.
Estas discussões têm também um caráter internacional, visto a importância da temática da educação indígena na educação, tendo lugar nas legislações internacionais, o OIT ( Organização Internacional de Trabalho), que adotou em uma convenção de numero 169, sobre os povos indígenas e tribais em 27/06/1989, uma exigência que:
Deverão ser adotadas medidas de caráter educativo em todos os setores da comunidade nacional, e especialmente naqueles que estejam em contato mais direto com os povos interessados, com o objetivo de se eliminar os preconceitos que poderiam ter com relação a esses povos. Para esse fim, deverão ser realizados esforços para assegurar que os livros de História e demais materiais didáticos ofereçam uma descrição equitativa, exata e instrutiva das sociedades e culturas dos povos interessados. ( BRASIL apud GOBBI, 2003, p. 224).

Desta forma contribuindo com as investigações dos programas voltados à educação, fazendo com que  o Estado cumpra com o que é definido pelas leis nacionais e internacionais, assim reforçando a importância da emergência de movimentos que buscavam reconhecimento da diversidade cultural e suas conquistas sociais, culturais e econômicas. 
O que observamos é que o Brasil tinham sérias dificuldades de reconhecimento de uma diversidade, pluricultural e multiétnico, sendo de importância fundamental o papel da escola no reconhecimento deste, ou de reprodutora de preconceitos e estereótipos já enraizados no imaginário social, sendo assim palco de debates para tais questões. De acordo com Gobbi apud Gusmão (p.225) a uma grande preocupação em estabelecer uma educação voltada para o respeito à diversidade, com intuito de assumir um papel de agente transformador, promovendo o conhecimento mútuo entre os diferentes.
Grandes conquistas ocorreram com mudanças nas legislações educacionais brasileiras, principalmente na forma de se tratar os conhecimentos dos povos indígenas nas escolas, sua contextualização, consequências e desafios.
Com a Constituição Federal de 1988  algumas dessas mudanças se deram no ensino fundamental, onde a utilização da língua portuguesa como língua regular foi definida, mas  assegurava a comunidade indígena o direito de utilizar sua própria língua materna nos processos de aprendizagem;  garantia o exercício dos direitos culturais e acesso as fontes de cultura nacionais e apoiaria a difusão das  manifestações culturais; protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras e o reconhecimento dos índios sua organização social, costumes, crenças e tradições.
A LDB (BRASIL, 1996) também contribuiu para tais processos exigindo  que as escolas e instituições de educação infantil  deveriam trabalhar com questões relativas a diversidade cultural. Sendo que art. 26 concerne aos currículos do ensino fundamental e médio o dever de uma base nacional comum, sendo complementada com características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e clientela.
 O Sistema de Ensino da União com colaboração das agencias federais buscaria fomentar cultura e assistência aos índios, desenvolvendo programas integrados de ensino e pesquisa, para ofertar educação escolar bilíngue e intercultural aos povos indígenas, proporcionando aos índios a busca da recuperação de suas memórias históricas reafirmando suas identidades étnicas, valorizando suas línguas e por fim garantindo aos índios acesso a todas as informações da sociedade nacional e demais sociedades indígenas.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais, PCNs também tiveram grande importância no processo de resgate desta identidade, pois forneceu a sociedade indígena uma valorização quanto a sua pluralidade cultural, dando à escola a oportunidade de contribuir no combate ao preconceito e a discriminação no que tange a construção da identidade indígena até então baseada no senso comum, e nas lendas apresentadas pelos livros didáticos.
É preciso explicitar sua ampla e variada diversidade, de forma a corrigir uma visão deturpada que homogeneíza as sociedades indígenas como se fossem um único grupo, pela justaposição aleatória de traços retirados de diversas etnias. Nesse sentido, a valorização dos povos indígenas faz-se tanto pela via da inclusão nos currículos de conteúdos que informem sobre a riqueza de suas culturas e a influência delas sobre a sociedade como um todo, quanto pela consolidação das escolas indígenas que destacam, nos termos da Constituição, a pedagogia que lhes é própria. (BRASIL, 1997 apud GOBBI, p. 227).

Portanto tal preocupação se encontra também no Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (GOBBI, apud BRASIL, p. 228), que reforça que tal pratica educativa também serve para promover e ampliar condições necessárias para o exercício da cidadania da criança brasileira. Dando condições para que estas crianças possam em suas formas mais especificas pensar e compreender a realidade social e cultural a fim de aprender a respeitar e conviver com a diversidade cultural nas suas mais variadas manifestações.
 De acordo com (GOBBI p. 229), as pesquisas trataram de análises de livros didáticos que continham muitos deles equívocos e conceitos que geraram constrangimentos e preconceitos quanto aos povos indígenas, desde a colonização, escravidão e catequização, os modos de vida, variedades linguísticas e culturais.
Como verificado no texto grande parte dos livros didáticos concebiam aos indígenas pressupostos evolucionistas e valores etnocêntricos, citando-os como pessoas do passado e seus conhecimentos desvalorizados, muitos também se referiam aos indígenas como povos primitivos causando assim depreciação dos seus valores, outros associavam os índios a pré-história. Era muito comum utilizar o termo “descobrimento” fazendo-se referencia a chegada dos portugueses ao Brasil, percebe-se assim o tom evolucionista nas abordagens dos livros didáticos, pressumindo que a evolução da história se passava por etapas.
Os índios que viviam no Brasil quando os portugueses desembarcaram, em 1500, eram muito primitivos. Ainda estavam na Era da Pedra Lascada, isto é, não sabiam fazer ferramentas de ferro ou de outros metais. Eles influenciaram na língua, na alimentação e nos nomes de localidades e acidentes geográficos. (GOBBI apud SILVEIRA, p. 231).


De acordo com LEVI-STRAUS é preciso atentar para o fato de que “as culturas humanas não diferem entre si do mesmo modo, nem no mesmo plano”.
Para tratar certas sociedades como “etapas” do desenvolvimento de outras, seria preciso admitir que, enquanto para estas últimas acontecia alguma coisa, para as outras nada acontecia – ou poucas coisas. (LEVI-STRAUS, 1976, p. 330).

 Estas comparações servem para mostrar quanto os livros didáticos contribuíram ao longo do tempo para desvalorização da cultura indígena em favor das culturas europeias, baseando-se no ponto de vista  do que os europeus tinham de avanços materiais em relação aos povos indígenas.
Muitas outras contradições foram disseminadas sobre os povos indígenas, e que foram repassados por livros didáticos destinados a educação. Na colonização referiam-se aos índios que habitavam o Brasil como um único povo, sendo que havia várias sociedades e culturas diferentes, outro ponto é que apontavam os índios como povos passivos ao processo de colonização e por fim eram apresentados os índios como os que lutavam contra seu próprio povo ou os negros.


Os índios, depois de integrados à sociedade colonial, funcionavam como capitães do mato na perseguição de negros escravos fugidos e trabalhavam também na pecuária, uma atividade que lembrava a caça para eles. (CARMO; COUTO, apud p. 235).


Estas contradições mostraram a incapacidade de certos órgãos governamentais na aprovação de livros que pudessem trazer formas preconceituosas e estereotipadas de se ver e construir a sociedade indígena.

Autores
Carolina Aparecida
Carlos Renato
Geusa Nascimento

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